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Como Você Classificaria? STAB - Set/Out 2010

Elaborar equalizações técnicas de propostas é uma das atividades mais freqüentes na vida dos engenheiros que trabalham em projetos de plantas de processo. Trata-se normalmente de um trabalho de tabulação de informações diversas previamente solicitadas nas cartas convite que foram respondidas pelos fornecedores potenciais.

Embora uma tabulação correta e objetiva das informações técnicas seja indispensável, o que o cliente na verdade precisa é uma classificação técnica dos fornecedores, de maneira que, ao considerar a classificação comercial das propostas, ele possa ter argumentos sólidos para a decisão final de compra.

A questão é: quais critérios usar para uma classificação técnica correta das propostas? Freqüentemente as propostas técnicas são muito similares, principalmente aquelas que atendem de forma adequada à carta convite, e neste caso uma classificação de forma objetiva torna-se uma tarefa mais complicada.

É evidente que cada equipamento terá particularidades específicas que poderão decidir uma classificação, mas também é verdade que existem critérios que podem ser usados de uma forma geral para qualquer tipo de equipamento. Vamos discutir alguns destes critérios.

Referências. Um produto com maior número de referências de clientes satisfeitos é sem dúvida um fator importante. Mas é preciso confirmar diretamente com os “clientes satisfeitos” se as referências são realmente procedentes.

Materiais. Trabalhamos em um ramo da indústria onde as condições de abrasão e de corrosão podem ser muito severas. Produtos fornecidos com materiais que apresentam maior resistência à abrasão e à corrosão apresentam vantagens. E se o velho aço carbono estiver sendo usado por questões de custo inicial, diferenças nas espessuras podem ser o fiel da balança.

Potência instalada. Aqui a questão pode ser mais complicada. Potência alta pode ser sinal de robustez, mas pode também ser sinal de baixa eficiência. Fica evidente que, uma vez garantidas as condições operacionais relativas à capacidade e à eficiência, menor potência instalada será vantajoso para o cliente. Mas há certas aplicações, onde os equipamentos estão sujeitos a sobrecargas mais ou menos imprevista, que folga na potência instalada pode ser desejável.

Perda de carga. Pode ser decisiva, pois quase sempre valores altos de perda de carga estão relacionados com desgaste e com consumo de potência. Na operação da usina grandes massas de fluidos são deslocadas de um ponto para outro, e quando isto ocorre com altas velocidades temos equipamentos comparativamente mais baratos, porém à custa de mais desgaste e de mais potência. Naturalmente existem casos específicos onde velocidades altas são indispensáveis como, por exemplo, em tubulações onde a assepsia é indispensável ou onde há materiais em suspensão. Trocadores de calor com mesmo coeficiente de troca térmica podem ser diferenciar pela menor perda de carga em operação. Colunas de destilação com menor perda de carga permitem operação com vapor com temperatura mais baixa. Separadores de arraste com menor perda de carga permitem um nível de vácuo mais adequado em evaporadores e em tachos. E assim por diante.

Os critérios gerais acima são alguns dos que devem ser comparados quando analisamos equipamentos individualmente. E se tivermos que classificar propostas de plantas greenfield completas? Como proceder?

Recentemente desenvolvemos toda a documentação para a cotação de uma usina completa no Sudão. Trata-se de uma usina para produzir 100% de açúcar refinado e para produzir etanol combustível apenas de mel residual, além da venda de energia elétrica.

Para que o cliente final pudesse ter melhores condições de negociação, o projeto foi dividido em pacotes de fornecimento, de maneira que um único fornecedor pudesse entregar todos os pacotes ou que algum pacote específico pudesse ser pinçado de outro proponente. Os pacotes ficaram divididos da seguinte maneira:

Pacote #1: Descarga de cana e separação / preparação de palha.

Pacote#2: Preparação de cana e extração de caldo com moendas.

Pacote #3: Tratamento de caldo, evaporação e produção / refinação de açúcar com empacotamento.

Pacote #4: Fermentação, destilação, desidratação e concentração de vinhaça.

Pacote #5: Produção e distribuição de vapor, energia elétrica e ar comprimido.

Pacote #6: Utilidades diversas: parque de produtos químicos, tratamento de água, combate a incêndio, etc.

A integração de todo o sistema de automação da planta ficou por conta do fornecedor do Pacote #3.

A equalização técnica dos diversos pacotes, como era previsível, demonstrou que fornecedores diferentes eram superiores em alguns pacotes e inferiores em outros. Restou então o desafio. Como classificar as propostas técnicas no caso de se comprar todos os pacotes de um único fornecedor?

A solução encontrada foi atribuir pesos distintos para os diferentes pacotes, levando-se em consideração os aspectos confiabilidade e eficiência, nesta ordem. Esta ordem foi adotada porque acreditamos que o cliente prefere uma planta que não para nunca, mesmo não sendo ideal do ponto de vista de eficiência, do que uma planta que tem eficiência ideal, mas que para freqüentemente devido à falta de confiabilidade. Aliás, operação contínua e estável é um dos requisitos básicos para se ter alta eficiência.

Foram atribuídos para cada pacote pesos de 1 a 4 por ordem de importância. O número par é proposital, pois sempre temos a tendência de colocar a nossa classificação na “média”, quando estamos em dúvida. Com um número par temos produtos caminhando para uma boa classificação ou para uma má classificação, fugindo assim do meio-termo.

Atribuímos peso 4 para o Pacote #5. Nenhum setor da planta opera sem vapor ou sem energia, principalmente quando a planta é 100% eletrificada. Podemos por exemplo refinar açúcar ou produzir etanol sem moer cana, podemos moer cana sem produzir etanol, mas sem vapor e energia nada se faz. Por outro lado, a eficiência energética dos equipamentos é fundamental. Caldeiras produzindo o máximo de vapor por tonelada de bagaço queimado e turbo-geradores produzindo o máximo de MW.h por tonelada de vapor motriz.

Atribuímos peso 3 para o Pacote #2. Este setor tem equipamentos que exigem muita confiabilidade mecânica dos equipamentos, além de ser o setor que em um projeto como este (pouca produção de etanol) apresenta a maior perda individual em todo o processo, representada pelo açúcar perdido no bagaço. Portanto, há aqui uma mescla de confiabilidade e eficiência.

Atribuímos peso 3 para o Pacote #3. Neste setor a alta confiabilidade não é tão difícil de ser atingida. A grande maioria dos equipamentos é de caldeiraria, e os equipamentos mecânicos como centrífugas, por exemplo, sempre contam com unidades de reserva. Porém, como neste projeto o objetivo é produzir o máximo de açúcar refinado, trata-se de um setor importante do ponto de vista da eficiência industrial e da qualidade do produto final.

Atribuímos peso 2 para o Pacote # 4. Neste setor a confiabilidade não é tão relevante, pois como há grandes reservatórios para mel final, a falta de produção de etanol não impede a moagem de cana por períodos determinados. Por outro lado, como será produzido etanol apenas do mel residual, a importância desta produção no resultado operacional da empresa fica assim reduzida.

Atribuímos peso 2 para o Pacote #1. Este setor, embora importante, apresenta equipamentos de pouca complexidade mecânica, e sempre será possível moer cana sem separação de palha se algum imprevisto ocorrer. Trata-se de um setor com relativamente pouca influência na eficiência do processo, a menos que a separação da palha seja interrompida.

Atribuímos peso 1 para o Pacote #6. Trata-se de componentes que tem pouca influência na eficiência da planta e que normalmente não apresentam problemas relevantes no que diz respeito à confiabilidade.

Desta maneira, ponderando a classificação de cada pacote com o seu peso correspondente, foi possível chegar a uma classificação por pacotes completos.

Naturalmente a ponderação dos pacotes pode ser alterada em função de cada projeto específico. Por exemplo, uma planta que produza mais etanol do que açúcar.

De qualquer maneira, fica aqui uma sugestão. Como você classificaria?

Celso Procknor
celso.procknor@procknor.com.br