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Válvula de Segurança X Disco de Ruptura STAB - Jan/Fev 2014

Já mencionamos algumas vezes neste espaço que nos últimos anos o setor industrial das usinas de cana de açúcar tem mudado de forma radical. É a assim chamada “legalização” dos equipamentos e das instalações, os quais devem ser construídos e montados estritamente dentro das normas técnicas aplicáveis e vigentes na legislação brasileira.

Nossa intenção hoje é discutirmos a seleção dos dispositivos de proteção para fermentadores usados em sistemas de fermentação por bateladas, que é o sistema mais utilizado no Brasil. Mas os princípios também se aplicam aos sistemas de fermentação contínua.

Embora fermentadores de menor porte sejam aplicáveis em projetos fora do Brasil, para plantas no nosso país temos projetado fermentadores com volumes na faixa de 1.000 a 3.000 m³.

São reatores com dimensões consideráveis e que, considerando-se que são vasos de pressão trabalhando acima de pressão atmosférica e sob risco de serem submetidos a uma pressão negativa (vácuo), devem ser projetados com a utilização de softwares específicos para esta finalidade, os quais possibilitam a emissão dos memoriais de cálculo detalhados que as normas técnicas exigem.

Os projetos de fabricação e de instalação devem atender às exigências pelo menos das Normas NR-13 (projeto de vasos de pressão) e NBR-8800 (projeto de estruturas), além de várias outras mais específicas.

Em condições normais de operação a pressão positiva nos fermentadores é decorrente da perda de carga nas tubulações de gás carbônico e nas torres de recuperação de etanol (TRE), que “lavam” o gás carbônico antes de ser lançado na atmosfera. Já a pressão negativa nos fermentadores pode ser decorrente de procedimentos inadequados durante esvaziamentos e limpezas, entre dois ciclos fermentativos ou durante serviços de manutenção.

Com relação à pressão positiva nos vasos, a perda de carga nas tubulações depende naturalmente dos diâmetros e dos traçados das linhas, mas tipicamente encontra-se na faixa entre 40 e 60 mm.c.a..

As primeiras TRE’s tinham enchimentos com anéis “Pall” e eram projetadas com perdas de carga entre 300 e 400 mm.c.a.. Mais recentemente passaram a ser oferecidos pelos fabricantes projetos de TRE’s com bandejas do tipo “válvula” ou do tipo “calota”, com a justificativa de se obter uma melhor recuperação de etanol, mas com perda de carga entre 700 e 800 mm.c.a..

Esta diferença de 500 mm.c.a. na perda de carga da TRE pode parecer pequena, mas no caso de fermentadores de grande porte pode ser muito representativa. Pode significar a diferença entre atender ou não as normas construtivas no caso de fermentadores existentes, pois a PMTA (Pressão Máxima de Trabalho Admissível) com a qual o vaso de pressão é calculado deve estar acima da soma das perdas de carga nas linhas e na TRE, para evitar que os dispositivos de segurança sejam constantemente acionados.

Temos tido dificuldades junto aos fabricantes das TRE’s quando solicitamos que a perda de carga seja reduzida. Mencionam que a eficiência seria prejudicada e sugerem aos clientes reforçar os fermentadores para atender a uma PMTA mais alta. Ocorre que sistemas de fermentação dispõem de seis a oito fermentadores de grande porte, sendo muito mais caro intervir nestes equipamentos do que, por exemplo, instalar duas TRE’s em paralelo visando reduzir a perda de carga em função de uma menor vazão específica de gás carbônico por superfície transversal de TRE. Temos que estudar com os fabricantes todas as alternativas para encontrarmos a de menor custo que respeite as normas técnicas correspondentes.

Com relação à pressão negativa nos vasos, o vácuo pode ser criado basicamente em função do esvaziamento do líquido sem que haja entrada de ar ou de gás carbônico no fermentador ou em função de condensação súbita e intensa de vapor de água contido no fermentador, provocada pela introdução de algum líquido a baixa temperatura no equipamento.

No primeiro caso (esvaziamento) é perfeitamente possível calcular com precisão a quantidade de ar que deve ser admitida no fermentador para evitarmos vácuo no mesmo, já que esta quantidade está relacionada com a capacidade de bombeamento disponível no sistema.

No segundo caso (condensação súbita e intensa) é muito difícil dimensionar um dispositivo de segurança para admitir ar no equipamento, já que as vazões instantâneas podem ser muito altas. Basta lembrar que 100 kg de vapor ocupam um volume cerca de mil vezes maior do que o volume ocupado por 100 kg de condensado. Se condensarmos 100 kg de vapor dentro do fermentador teremos que admitir rapidamente algo como 100 m³ de ar. A vazão horária correspondente é altíssima, não há dispositivo de segurança que possa atender uma demanda destas.

Os fermentadores são normalmente dimensionados para atender a certa pressão positiva. Uma vez calculado o vaso, verificamos qual a pressão negativa que o mesmo suportaria sem reforços adicionais. Via de regra este valor está na faixa de 20 a 40 mm.c.a., um valor relativamente baixo. Os custos para reforçar o vaso para atender uma pressão negativa maior seriam absolutamente proibitivos.

Portanto o caminho adequado é tomar todas as medidas para evitar que a condensação ocorra dentro do vaso. Deve ser absolutamente proibido admitir vapor ou líquido super aquecido, que vai resfriar e gerar vapor por expansão (flash). Dever ser absolutamente proibida a introdução simultânea de líquidos frios durante as operações de limpeza CIP com líquidos quentes, como flegmaça por exemplo.

Outra providência indispensável é a nossa recomendação para não se instalar nenhum tipo de válvula de retenção ou de bloqueio na saída do gás carbônico no topo do fermentador. São equipamentos absolutamente inúteis, muito difícil de serem limpos de uma maneira adequada que garanta inexistência de contaminações e que podem evitar a introdução eventual de um volume enorme de gás carbônico que está sendo produzido em outros fermentadores. Numa condição inesperada de condensação de vapor, é mais fácil introduzir gás carbônico com pressão positiva do que ar com pressão atmosférica.

Definidos assim os valores de PMTA positiva e negativa temos então que dimensionar os dispositivos de segurança a serem instalados no vaso de pressão. Na realidade o termo técnico comumente usado para o baixo nível de pressão destas aplicações é “dispositivos de alívio de pressão e/ou vácuo”, que podem ser válvulas ou dispositivos de ruptura.

Entre as válvulas temos modelos com mola ou com peso, com função simples (pressão positiva ou pressão negativa) ou com função dupla (pressão positiva e pressão negativa). Existem também válvulas do modelo piloto operada que também podem ter função simples ou função dupla.

A simbologia conforme a Norma ISA para válvulas de alívio de pressão é PSV (Pressure Safety Valve) e para discos de ruptura a simbologia é PSE (Pressure Safety Element).

No caso de pressão positiva o PSE costuma ser mais barato que a PSV, mas tem que ser trocado toda vez que houver uma ocorrência. É importante avaliar a relação custo / benefício no longo prazo.

No caso de pressão negativa o PSE é proporcionalmente muito mais caro, chegando mais perto do valor da PSV.

Temos recomendado aos nossos clientes a instalação de PSV’s corretamente selecionadas. O custo de instalação é mais alto, mas o custo de manutenção é mais baixo. E sempre pode existir o recurso de pequenas alterações na calibração das pressões de alívio, o que não ocorre no caso do disco de ruptura.

Celso Procknor
celso.procknor@procknor.com.br