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Qualidade do Condensado: Pressão Diferencial X Transformer STAB - Set/Out 2015

É inegável que empresas que instalaram sistemas eficientes de cogeração e de geração de energia elétrica estão mais aptas a passar por estes difíceis tempos de crise que estamos vivendo. A venda de energia elétrica pode ser o diferencial para termos o balanço no azul ou no vermelho.

As variedades de cana energia passam a ser uma alternativa real para empresas que hoje utilizam bagaço de cana e que não pretendem substitui-lo por combustíveis de origem fóssil.

A palha da cana é cada vez mais utilizada para a geração de energia elétrica. E está começando a se consolidar a preferência pelo transporte de palha em fardos, em vez de se trazer a palha excedente junto com a carga de cana.

Trazer a palha enfardada significa trazer um combustível mais seco e com maior densidade, reduzindo assim o custo do diesel. Ainda existe o dilema a respeito de triturar a palha no campo (consumindo diesel) ou de triturar a palha na usina (consumindo energia elétrica).

Queimar combustível além daquele que atende às necessidades do nosso processo não é cogeração, é geração de energia elétrica. E o que define a lucratividade de um ciclo de geração é o consumo específico de combustível e a relação entre os preços do combustível e da energia elétrica.

Importante frisar que no caso de cogeração, ou seja, quando estamos queimando o combustível estritamente necessário para as necessidades do nosso processo e queremos aproveitar o ciclo termodinâmico para gerar o máximo de energia elétrica com este mesmo combustível (ciclo de contrapressão), os níveis de pressão e de temperatura estão bem determinados em função da eficiência das turbinas disponíveis no mercado para a faixa de potencia típica da agroindústria. Estes valores estão ao redor de 87 bar e 525 C, podendo variar um pouco em função da turbina específica que foi selecionada e dos custos de materiais e de instalação. Mas se vamos queimar grandes quantidades de combustível adicional em ciclos termodinâmicos de condensação tudo muda de figura. O que determina as características do vapor motriz é a economia do ciclo de geração.

Desta maneira ciclos termodinâmicos cada vez mais sofisticados estão sendo considerados nas plantas de processamento de cana quando se pretende ter geração de energia elétrica. Nestes casos pode ser adequado operar com vapor motriz de pressão e temperaturas acima das quais estamos acostumados. E para estas caldeiras especiais a qualidade do condensado que retorna às mesmas é de fundamental importância para preservarmos a integridade destes equipamentos que têm custos vultosos.

O objetivo deste texto é discutir os dois sistemas que temos adotado para garantir a qualidade do condensado de vapor de escape que retorna para as caldeiras de alta pressão e alta temperatura. Por ser ultrapassado, não vamos considerar um sistema antigo, que inclusive ainda vimos recentemente em um projeto de cogeração, que usa três tanques de condensado para que cada um seja analisado individualmente antes de ser utilizado nas caldeiras. Neste caso específico os tanques não estavam isolados, havia uma grande perda de calor, um custo enorme de implantação e um alto custo operacional.

Em primeiro lugar, é importante destacar que consideramos sempre que 100% do vapor de escape (VE) devem ser condensados no primeiro efeito do sistema de evaporação de caldo de cana.

No sistema de pressão diferencial partimos do princípio de que em operação normal existe uma diferença de pressão de 0,5 a 0,7 bar entre o vapor vegetal do primeiro efeito (V1) e o VE, diferença esta que corresponde a cerca de 6 m de pressão hidrostática de uma coluna de caldo dentro do tubo do evaporador.

Assim, em operação normal, caso exista um furo nos tubos ou um vazamento na ligação entre tubos e espelhos, o que vai ocorrer é um vazamento de VE para o lado de V1 em função da diferença de pressão, e não vice-versa. A qualidade do condensado de VE (CE) fica assim preservada.

Para garantir esta qualidade instalamos, com redundância, medidores de pressão diferencial VE/V1 em todos os evaporadores. Sempre que esta pressão diferencial ficar abaixo do ponto de ajuste o CE é desviado por um sistema de válvulas automáticas até um tanque de condensados descartados, e um sistema de alarme informa os operadores da central termoelétrica a respeito do evento.

Importante lembrar que é durante os procedimentos de partida e de parada dos evaporadores que existe a maior probabilidade de ocorrer contaminação do CE, mas o sistema de pressão diferencial, embora simples, apresenta uma boa confiabilidade.

Por outro lado, caso o VE esteja sendo usado em aquecedores de caldo, este sistema não pode ser aplicado, pois neste caso a pressão de caldo dentro dos tubos muito provavelmente será maior do que a pressão do VE.

Como garantia adicional podemos instalar ainda medidores de condutividade na linha de CE que vai até o desaerador, ou até sistemas sofisticados que medem o carbono orgânico total (TOC) como um cliente nosso uma vez solicitou, mas a nosso ver o que dá garantia ao sistema é o medidor de pressão diferencial.

O outro sistema que temos instalado é o chamado “transformer”. Do que sabemos, nos primeiros projetos de cogeração implantados na Ilha de Reunião, ocorreram sérios acidentes com as caldeiras em virtude de contaminação severa do CE. Então eles resolveram instalar um sistema absolutamente seguro, que é o que eles denominam transformer. Nós instalamos alguns deles aqui no Brasil.

O transformer é basicamente um evaporador que recebe o VE das turbinas (VET) e que produz um VE para o processo (VEP). O VEP é que vai entregar calor para o primeiro efeito da evaporação e assim, caso ocorra contaminação do CEP, as caldeiras não serão afetadas.

Utilizamos aqui no Brasil um evaporador do tipo filme descendente para podermos trabalhar com uma mínima diferença de temperatura entre o VET e o VEP. Normalmente projetamos o equipamento com um diferencial de pressão de no máximo 0,5 bar e com superfície extra para condensar VET com ligeiro superaquecimento, visando não perder energia no ciclo termodinâmico.

Não é preciso instalar equipamentos de reserva, pois como os dois fluidos são limpos é possível inspecionar os tubos apenas na parada anual para a inspeção obrigatória da caldeira. Em evaporadores deste tipo, é muito remota a possibilidade de vazamento de VEP para o ambiente do VET, pois como não há procedimentos de limpeza, a pressão do lado VET está sempre elevada. Além disso, não há coluna de líquido dentro dos tubos.

Naturalmente esta maior segurança custa mais investimento, mas o uso do transformer abre possibilidades interessantes se quisermos implantar ciclos termodinâmicos mais sofisticados combinando a cogeração e a geração de energia. Vapor motriz com temperatura mais elevada vai nos entregar VE com temperatura acima da que necessitamos, mas o transformer pode eventualmente fazer este ajuste.

Celso Procknor
celso.procknor@procknor.com.br