Notícias do Congresso
No início do mês de Agosto encerrou-se em Durban, na África do Sul, o 26º Congresso da ISSCT, International Society of Sugar Cane Technologists. Algumas novidades e tendências, não muitas infelizmente, merecem sem dúvida ser mencionadas.
As palestras apresentadas em plenário, via de regra, insistiram em evidenciar o potencial energético da cana de açúcar. Todas as apresentações indicaram a tendência futura do açúcar alimento (que também é energia) tornar-se um subproduto, sendo a energia em si, na forma de etanol, de energia elétrica ou de outras formas, o produto principal. Os trabalhos enfatizaram a característica, específica da cana, de ser a planta que mais produz biomassa por hectare por ano, característica esta que deverá ser cada vez mais otimizada pela engenharia genética. Infelizmente ainda há mais conversa do que ações práticas para se adotar a cana energética, principalmente nos países onde o mercado do açúcar é protegido e os produtores o vendem por um preço muito acima daquele praticado no mercado livre mundial. Neste aspecto o Brasil está na dianteira.
No âmbito da Comissão de Subprodutos não tomamos conhecimento de nenhuma novidade específica que tivesse sido implantada em escala comercial.
Muitos trabalhos a respeito das variáveis para a produção de energia elétrica a partir de bagaço foram apresentados, mas sem maiores novidades em relação ao que se pratica no Brasil. Para nossa decepção não apareceram trabalhos consistentes a respeito do aproveitamento da palha de cana colhida sem queimar. Aparentemente vamos ter que usar os parâmetros dos testes atualmente sendo desenvolvidos no Brasil, sem ajuda e sem referências de outros países.
Dentre os trabalhos apresentados, merecem destaque um que revisa os conceitos de termodinâmica aplicados em ciclos de cogeração e dois que apresentaram os resultados preliminares de pesquisas a respeito de gaseificação de bagaço. Embora estejam ainda em fase de laboratório, vimos que a Austrália principalmente, e em colaboração como Japão, estão investindo em pesquisas nesta área. Como sabemos, a gaseificação do bagaço excedente para a produção de energia elétrica ou de combustíveis líquidos é uma alternativa à hidrólise do bagaço excedente para a produção de etanol por via fermentativa.
Vale a pena também uma menção ao trabalho que avalia o potencial agrícola da África para a produção de cana visando etanol e energia. É um potencial respeitável, mas que em muitas regiões carece de práticas de irrigação para se viabilizar.
No âmbito da Comissão de Engenharia Industrial estava sem dúvida a grande novidade do Congresso. Trata-se do difusor Bosch, que está sendo comercializado no Brasil pela Dedini, e cuja unidade industrial tivemos a oportunidade de visitar. Este difusor utiliza o princípio do “walking floor” (piso que anda), já utilizado na Austrália em alguns sistemas de armazenamento de bagaço. Com esta tecnologia evita-se as correntes e o eixo motriz dos difusores mais comuns do mercado, trocando-os por duas centrais de óleo hidráulico que comandam os pistões que permitem o movimento de vai e vem dos setores de telas. Embora possa haver discussão a respeito de qual sistema custa mais em manutenção, correntes ou sistemas hidráulicos, é inegável que esta nova tecnologia torna o difusor modular, podendo-se aumentar a sua largura em uma entressafra caso se pretenda aumentar a sua capacidade. Esta modularidade é realmente o diferencial importante.
Outros trabalhos interessantes apresentaram resultados sobre a circulação natural da massa cozida em tachos em bateladas e estudos sobre as quantidades de bagacilho que retornam à moenda e sua influência na regulagem das aberturas.
O nosso sistema de sucção de caldo que transborda por sobre o rolo superior (aqui conhecido como “chupa cabra”) foi apresentado por um técnico australiano como uma grande novidade.
No âmbito da Comissão de Processo vários trabalhos merecem menção. Um trabalho apresentou o bom desempenho de um medidor de cor de açúcar em tempo real aplicado à produção de açúcar tipo VHP, que poderia bem servir para o nosso açúcar cristal.
Um trabalho apresentou os resultados práticos, na Usina Felixton da África do Sul, de uma planta de tratamento de caldo por meio de membranas de ultra-filtração. O processo, que já estudamos no passado em escala de planta piloto no Brasil com resultados similares, permite a produção de açúcar refinado padrão Europeu #2 sem dissolução, visando obter economia de energia térmica. Trata-se de um processo cuja viabilidade econômica depende muito do preço das membranas e do custo do combustível.
Outro trabalho interessante apresenta resultados comparativos do desempenho de circuladores mecânicos com diversas configurações para tachos a vácuo. A conclusão indica para impulsores radiais como sendo os ideais, o que contraria a nossa prática no Brasil onde usamos com sucesso os impulsores axiais. Talvez os resultados tenham sido influenciados pela necessidade específica de otimização de circuladores radiais já existentes na Austrália.
Um outro estudo detalhado feito na Austrália indica as zonas mortas na área de remoção de lodo em clarificadores sem bandejas. A recomendação é retirar parte do caldo claro pelo costado do clarificador.
Houve também a apresentação dos tachos contínuos com duplo compartimento do Grupo Fives Cail, aplicados para massas cozidas de alta pureza, e que já são realidade no Brasil para o processamento de massa A na produção de açúcar cristal.
No âmbito da Comissão de Gerenciamento talvez o único trabalho que mereça menção seja aquele que descreve a fusão de duas usinas na Flórida em uma única unidade de grande capacidade. Como estamos projetando várias unidades similares no Brasil, vale a pena conhecer.
Além das sessões técnicas, havia os estandes de expositores diversos. Algumas novidades merecem menção.
A empresa Tongaat-Hulett da África do Sul apresentou o projeto de um novo tacho contínuo que deve operar na próxima safra de 2008. Parece um cruzamento do projeto Langreney com o projeto BMA, com dois tachos cilíndricos verticais superpostos, cada um com cerca de seis compartimentos e sem circulador mecânico. A vantagem preconizada é a economia de espaço horizontal e redução de potência. A conferir.
A empresa Bundaberg da Austrália apresentou a sua moenda de dois rolos. Trata-se de dois rolos horizontais com um grande chute de alimentação, mas para uma moenda de 2300 mm de comprimento eles indicam uma capacidade máxima de 400 t/h. Não entendemos muito bem as vantagens, embora haja menor consumo de potência.
Os técnicos sul africanos continuam insistindo que é mais barato usar correias para alimentar o bagaço nas caldeiras. É o sistema chamado “Smartfeed”. Mas é discutível para as grandes capacidades praticadas no Brasil, onde um transportador deve alimentar simultaneamente até duas caldeiras com capacidades de 250 a 300 t/h de vapor.
Eles também continuam usando os transportadores de correia para cana e bagaço sobre colchão de ar, para diminuir custos de manutenção com roletes. Seria preciso consultar empresas especializadas no Brasil para conferir, talvez no setor de mineração.
De todas as maneiras esta nossa visão do Congresso não deixa de ser parcial, pois é impossível assistir a todas as sessões. Assim, o melhor mesmo é ler os trabalhos e formar o seu próprio juízo de valor.