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Fábula da Centrífuga STAB - Mar/Abr 2006

- E aí Vibrante, como foi a sua produção no turno?

- Você sabe que eu odeio este apelido, Zé Marreta. Pega leve. Além disso, depois da última reforma estou vibrando muito menos, estou quase tão moderna como uma centrífuga de última geração.

- Calma lá, você continua é sendo uma "turbina". Centrífuga de última geração é esta aí do lado. Olha só os detalhes dela.

- E como um cara chamado Zé Marreta vai conseguir operar uma máquina nova destas? Você vai dar conta do recado?

- Este apelido é do tempo em que eu arrumava o seu raspador e os seus bicos só na base da martelada. Tempos passados. Tive treinamento para operar e manter esta máquina nova nos trinques. Martelo nunca mais!

- E ela já se adaptou à nossa usina?

- Está se adaptando. Mas assim como você, já começou a reclamar da massa cozida que o povo tá mandando lá de cima.

- Esse povo lá de cima parece espanador. Os caras vivem atrás de acabar com a poeira da massa o tempo todo!

- Também, com aquele cozedor antigo é jogo duro. O cozedor novo já produz massa cozida de melhor qualidade.

- Cozedor não Zé Marreta. É um tacho a vácuo. Cozedor é o operador.

- Neste tacho a vácuo novo o operador não faz quase nada. Ele já veio todo automatizado.

- Mas porque esta centrífuga nova está reclamando da massa do tacho antigo? Ela não é toda equipada para processar qualquer tipo de massa?

- Ela tem muitos dispositivos modernos. Tem um sistema que centraliza o cesto na descarga, assim o raspador pode quase encostar na tela sem riscos. Tem um sistema retrátil para os bicos de lavagem e que garante que a lavagem é bem uniforme em toda a altura do cesto. Dissolve pouco açúcar e quase não sobra açúcar após a descarga.

- Mas Zé Marreta, estamos no Brasil! Açúcar dissolvido vira álcool. O patrão não perde nada!

- Engano seu Vibrante. O patrão perde e eu também, no PPR. Açúcar é produto acabado, não tem o menor sentido dissolver produto acabado, é burrice. Gastamos energia e sobrecarregamos os equipamentos.

- Humm, ficou metido depois do treinamento!

- É verdade. Quando a gente aqui embaixo dissolve açúcar e manda de volta lá pro cozimento, o tacho antigo que não é lá aquele exemplo de rapidez, precisa processar mais material para produzir o mesmo açúcar. E parte do açúcar que é reciclado sofre degradação. Destruímos sacarose e produzimos compostos indesejáveis para o processo.

- A gente dissolve açúcar demais quando lava muito tempo?

- Quando lava mais do que o necessário e quando sobra açúcar demais no cesto, que acaba sendo dissolvido. Um pequeno excesso de água pode representar muito açúcar dissolvido.

- É, mas às vezes vem uma massa lá de cima que se não lavar bastante nada de produzir açúcar bom. Acho que é massa com cristal muito pequeno.

- Cristal maior, ou seja AM maior, é melhor, mas não é o mais importante. O mais importante é o CV. O coeficiente de variação ruim prejudica mais a centrifugação. É melhor ter um cristal pequeno com CV baixo do que ter cristal grande com CV alto. Quando o CV é alto os finos dificultam a drenagem do mel e deixam desigual a qualidade do açúcar. O açúcar perto da tela fica com cor mais elevada, e o açúcar perto dos bicos fica com cor mais baixa. Além disso, cristais pequenos passam pela abertura das telas e vão parar no mel.

- Peraí Zé Marreta! AM, CV? Você pode ir ao treinamento, mas eu não posso sair aqui da minha estrutura.

- É fácil entender Vibrante. AM é a abertura média. Dá uma idéia do tamanho médio dos cristais. O CV é o coeficiente de variação. Dá uma idéia de como varia este tamanho, pois é lógico que não é possível ter todos os cristais do mesmo tamanho. Quanto menor é o CV, mais uniforme é o tamanho dos cristais.

- Mas AM e CV dependem lá de cima do cozedor. O que podemos fazer?

- Nos podemos cuidar bem das telas para evitar a passagem de finos para o mel. Mas você tem razão, o pessoal tem que dar um jeito lá no tacho antigo.

- Coitado do tacho antigo, eles eram projetados assim antigamente. Só se ele fizesse uma lipo para acabar com aquele pneuzinho. Ficar do jeito do tacho novo, reto. E podia também tomar um banho de loja. Botar um sistema de automação completo.

- É isso ai. Devidamente modernizado este tacho vai produzir massa com CV tão bom quanto o do tacho novo.

- Mas Zé Marreta, vamos deixar de botar a culpa nos outros e vamos cuidar do nosso quintal. Vamos admitir que a massa cozida está adequada. O que temos que fazer?

- Antes de mais nada temos que garantir uma alimentação uniforme de massa no cesto e controlar sistematicamente o tempo de lavagem. Tempo curto pode produzir açúcar ruim. Mas tempo longo pode representar muita perda de açúcar. E às vezes o tempo está certo mas a camada de massa cozida não está uniforme. Nesta hora, se a camada está mais fina por exemplo, vai haver dissolução desnecessária de açúcar.

- E só o tempo de lavagem é importante?

- O tempo é importante mas também a uniformidade da distribuição ao longo da altura do cesto. Distribuição não uniforme, bicos entupidos por causa de água suja ou montados de forma incorreta, vão exigir mais água para garantir a mesma qualidade do açúcar.

- E a abertura da tela, não é importante?

- A abertura da tela deve estar coerente com a AM do açúcar que estamos produzindo. E deve possuir o máximo de área aberta para a boa drenagem do mel. Tela com abertura muito grande pode permitir a passagem em demasia de cristais para o mel. A centrifugação nada mais é do que uma filtração, é o mesmo princípio. O mel precisa passar pela tela que é o meio filtrante, mas os cristais não.

- Então é isso?

- Ainda falta a descarga bem feita. Se por exemplo em um cesto de uma centrífuga de 1750 kg deixamos na descarga uma camada de açúcar com a espessura de apenas um cristal de 0,75 mm, vamos estar dissolvendo cerca de 3,0 kg de açúcar em cada ciclo. É muita grana numa safra. A sua prima rica aí do lado já tem sistemas mais modernos para reduzir a sobra de açúcar no cesto ao mínimo possível.

- Trabalhar com operador treinado é outra conversa! Vamos então fazer um acerto com o povo lá de cima. Eles mandam massa cozida legal e nós não vamos mais dissolver açúcar à toa aqui embaixo.

- É isso aí Vibrante! O patrão fica feliz, meu PPR aumenta e ainda é capaz de sobrar algum dinheiro para a gente emprestar para a reforma do tacho antigo lá de cima.

- E quem vai agradecer é o meu amigo grandão lá da frente, o secador. Mas isto é papo para um outro dia. Vamos trabalhar que lá vem massa!

Celso Procknor
celso.procknor@procknor.com.br