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Evaporação em Bateladas STAB - Mar/Abr 2004

Tivemos recentemente uma discussão interessante em um cliente a respeito de sistemas para automação da evaporação. Esta discussão acabou gerando o mote para o texto de hoje. Trata-se de discutir uma prática que, embora venha se reduzindo sensivelmente nos últimos anos, ainda é muito comum em várias usinas. Consiste no expediente de tentar controlar o brix do xarope pela variação da sua descarga no último efeito da evaporação.

A primeira observação importante a fazer é que o brix do xarope não precisa ser absolutamente constante. Ele precisa é ser estável. Embora um brix de xarope constante fosse uma situação ideal, na prática existem variações de vazão do caldo decantado em função da moagem de variedades diferentes de cana, de variações na embebição, de variações na taxa de lavagem nos filtros, etc. Mesmo que todas as grandezas mencionadas não variassem, haveria variação do brix em função da variação das sangrias de vapor na evaporação, ocasionadas pela operação intermitente dos tachos em bateladas.

Na época em que a evaporação não tinha sistemas de automação, havia esta prática muito comum. Se o valor do brix do xarope abaixava, o operador fechava a saída do último efeito para esperar o brix aumentar. Como não era possível alterar de forma automática a vazão de caldo decantado que estava sendo enviado para a evaporação, o nível nos diversos efeitos aumentava. Quando o valor do brix subia um pouco, o operador abria a descarga do último efeito, provocando uma vazão excessiva, pois a alteração do nível alterava toda a dinâmica dos fluxos nos equipamentos. Esta operação errática da evaporação é que costumamos chamar de "operar evaporação em bateladas". Nada fica estável, nem a vazão e muito menos o brix do xarope, com todos os inconvenientes daí decorrentes.

A evaporação, como todo equipamento de processo, opera melhor se operar de forma estável. Para que ela opere de forma estável, é preciso que a vazão de caldo clarificado nos pré evaporadores seja estável. Notar que não estamos falando em vazão constante, mas em vazão estável. É difícil obter vazão constante em função das inúmeras variáveis de processo que mencionamos anteriormente.

Se queremos manter a vazão estável é preciso deixar outra grandeza variar, o nível por exemplo. Num processo de bombeamento qualquer, não é possível manter vazão e nível constantes. Ou estabilizamos o nível deixando variar a vazão ou então estabilizamos a vazão deixando variar o nível. Este é um conceito fundamental a respeito do qual muitos técnicos ainda não pararam para pensar mais detidamente.

Não é recomendável variar o nível nos evaporadores, pois nível alto provoca arrastes e diminui a troca térmica, e nível baixo provoca a possibilidade de aumento de temperatura dos tubos e eventual degradação de açúcar.

Assim, se temos que deixar variar o nível em algum ponto do processo, o ponto recomendável para deixar o nível variar é o tanque de caldo clarificado, pois ali o caldo já está tratado e quente, reduzindo riscos de contaminação. Para que haja possibilidade deste nível variar, o tanque de caldo clarificado deve ter uma capacidade pulmão satisfatória, na faixa entre 30 a 60 minutos de tempo de residência. Se o tanque é pequeno, não haverá possibilidade prática de ajustar um sistema de controle adequado.

Desta maneira, com um sistema de ajuste do “set point” do nível do tanque de caldo decantado em forma de rampa, é possível modular a vazão de caldo clarificado para a evaporação de maneira a evitar variações bruscas. Se o nível do tanque começa a subir, o sistema de automação faz a vazão de caldo aumentar parcialmente, e vice-versa. Esta antecipação da ação corretiva permite que a evaporação trabalhe com vazões muito mais estáveis. Se por acaso o nível baixar a valores extremos devido a uma parada momentânea de moenda por exemplo, água deve ser adicionada automaticamente no tanque para garantir a produção de vapor vegetal para o processo e a operação da evaporação como um todo. Se o problema na moenda persistir, então a capacidade de evaporação precisa ser reduzida, retirando-se evaporadores da linha de produção.

Pelas razões expostas acima vemos que não é necessário controlar o nível de caldo nos evaporadores. O nível de caldo será garantido pela própria construção interna dos evaporadores, bastando medir a vazões de caldo e dividir as mesmas de forma proporcional em função das capacidades de cada evaporador. Em outras palavras, a evaporação deve operar com as saídas sempre totalmente abertas, ou seja, todo o caldo que entra deve poder sair sem nenhum tipo de restrição.

O conceito nesta filosofia de operação é que o brix adequado do xarope será consequência de termos evaporação limpa, pressão de vapor de escape constante (esta sim pode e deve ser constante) e vazão estável de caldo na entrada com as saídas livres. Se isto não ocorre, deve estar faltando capacidade de troca térmica, e neste caso a única maneira de corrigir o problema será a redução do ritmo de moagem, já que represar caldo na evaporação não resolve absolutamente nada.

O brix do xarope deve ser medido para monitorar o seu comportamento, mas não com o espírito de atuar na vazão da evaporação. Este sinal de brix deve eventualmente ser usado para adequar o ritmo de moagem correto.

O monitoramento do valor do brix do xarope serve também para evitar valores muito altos em condições específicas de processo. Se o valor do brix subir demasiadamente, basta atuar no vácuo do último efeito para reduzi-lo. Se o vácuo diminui teremos menor troca térmica em toda a evaporação, e o valor do brix do xarope poderá ser corrigido a contento.

Resumindo, sistemas modernos de automação da evaporação usam medidores de vazão magnéticos para distribuir os fluxos de forma uniforme e estável nos diversos evaporadores, deixando a sua saída sempre livre. Não controlam o nível do caldo nos evaporadores, pois a construção adequada dos mesmos faz este trabalho de graça para nós. Tratam de manter constantes as pressões de vapor de escape e de vapores vegetais, pela atuação adequada de válvulas redutoras e de válvulas de alívio de vapor. E monitora os valores de brix do xarope para avisar aos operadores a respeito de possíveis anomalias no processo. E, se houver nível alto no tanque de caldo clarificado ou no tanque de xarope, só há uma solução: reduzir a rotação da turbina do primeiro terno da moenda (o que aliás pode ser feito de forma automática).

Ou seja, o brix estável do xarope será consequência de uma operação estável. Se causamos distúrbios na evaporação tentando corrigir o brix, não vamos chegar a lugar nenhum.

Celso Procknor
celso.procknor@procknor.com.br