Transformando Sucata em Bagaço
Uma situação que vem ocorrendo com certa freqüência nas usinas é a “sobra” de equipamentos que eram usados na produção de álcool quando as unidades passaram a aumentar a relação de sacos de açúcar por tonelada de cana. Em muitos casos não existe mais o caldo “direto” para álcool, nem mesmo o filtrado.
Por outro lado, a maior produção de açúcar, algumas vezes conjugada com maior produção de álcool anidro, representa maior consumo de vapor e, em decorrência, de bagaço.
Visando menor consumo de vapor de processo, pretendemos discutir algumas idéias, a maioria já colocada em prática, para aproveitar estes equipamentos, alguns dos quais já eram considerados como sucata.
Algumas usinas já fazem um pré aquecimento do caldo utilizando trocador a placas e vinhaça como fonte de calor. Nas usinas em que estivemos trabalhando, havia trocadores disponíveis para esta possibilidade, mas do ponto de vista físico era complicado trazer a vinhaça para perto do sistema de tratamento de caldo.
A solução adotada foi o aproveitamento dos regeneradores de calor (trocadores caldo / caldo do sistema de tratamento de caldo para álcool) fazendo o pré aquecimento do caldo primário com condensado de vapor vegetal V1.
Do lado caldo, escolhemos o caldo primário porque o mesmo tem menos bagacilho em suspensão do que o caldo secundário, provocando assim menor necessidade de limpezas devido a entupimentos. Além disso, o caldo primário tem menor temperatura do que o caldo secundário, proporcionando assim uma maior troca de calor para uma dada área de troca térmica existente.
Do lado do condensado C1, foi preciso tomar algumas providências para garantir que a sua temperatura não fosse reduzida por flasheamento. Dessa maneira um equipamento sem uso foi aproveitado, porém ficando com a possibilidade de ser utilizado novamente para a produção de álcool caso seja conveniente no futuro.
Em outro caso, havia na sucata um condensador de 400 m2 usado anteriormente em aparelho de destilação. Pequenas modificações nas tampas e nos passes dos tubos transformaram o condensador vertical em um aquecedor horizontal para caldo decantado. Utilizando vapor vegetal V1, foi possível pré aquecer o caldo decantado de 95 C para até 110 C, gerando economia de vapor de escape e ao mesmo tempo proporcionado maior taxa de evaporação no primeiro efeito.
Aliás, em muitas usinas existem aquecedores horizontais que eram usados para caldo álcool que se prestam perfeitamente para este fim. O pré aquecimento do caldo decantado, de preferência com vapor V1, é sempre muito benéfico. Aquecedores horizontais apresentam maior dificuldade para limpeza, mas quando operam com caldo decantado, que é muito mais limpo, esta desvantagem praticamente desaparece.
Em outra usina um pequeno balão de condensado e uma bomba centrífuga com variador de freqüência também puderam ajudar muito. Como sabemos, a melhor prática do ponto de vista de energia é procurar condensar 100% do vapor de escape no primeiro efeito da evaporação. A única possível exceção fica por conta dos refervedores da coluna C da destilaria, caso os mesmos não tenham área suficiente para trabalhar com vapor V1, que tem temperatura mais baixa.
De qualquer modo, bombeando todo o condensado de escape para o corpo do desaerador sem deixar o mesmo flashear, foi possível praticamente eliminar o consumo de vapor de escape no desaerador mesmo mantendo a sua temperatura na faixa de 105 C. Pequenas perdas de condensado de escape podem ser repostas por condensado do vapor vegetal V1 proveniente da evaporação do primeiro efeito, desde que os evaporadores do primeiro efeito tenham um sistema de separação de arraste adequado.
Esta solução, além de economizar bagaço, praticamente elimina a necessidade de tratamento de água para as caldeiras durante operação normal.
Outra possibilidade apareceu quando descobrimos na sucata um antigo evaporador para vinhaça tipo filme descendente com cerca de 200 m2, totalmente construído em aço AISI 316. Com esta área pequena não seria interessante tentar aproveitá-lo como evaporador para caldo.
A solução encontrada foi usá-lo como um pré concentrador de xarope flotado, já que evaporadores de filme descendente são tanto mais vantajosos quanto maior é o brix da solução e portanto quanto maior seria a elevação do ponto de ebulição correspondente. O vapor de aquecimento previsto foi o vapor vegetal do segundo efeito V2. Utilizando vapor V2, fazemos uma economia de vapor de escape, já que normalmente esta pré concentração do xarope seria feita nos tachos a vácuo com a utilização de V1. Com vapor V2 para aquecimento e usando o mesmo condensador do último efeito da evaporação existente, é possível obter uma taxa de evaporação na faixa de 45 kg/h.m2 e assim concentrar o xarope flotado de 60 a 70 % de brix.
Desta maneira, aliamos a vantagem de economia de vapor de escape com a vantagem de aumentar a capacidade do setor de cozimento, já que os tachos de massa A passam a evaporar uma menor quantidade de água, reduzindo o tempo de cozimento.
Estas soluções descritas são algumas idéias particulares que devem ser sempre enquadradas nos conceitos mais gerais para economia de vapor:
- procurar condensar 100 % do vapor de escape nos evaporadores do primeiro efeito e retornar todo o condensado direto para o desaerador;
- procurar não passar condensados de vapor de escape e de vapor vegetal até o segundo efeito em tanques atmosféricos, para evitar o flash e assim a perda de calor para a atmosfera;
- procurar aumentar a sangria de vapor do segundo efeito e, se possível e se necessário , passar a sangrar também do terceiro efeito.
Quando começar a sobrar vapor de escape, é hora de voltar a atenção para a eficiência das turbinas a vapor, e recomeçar tudo de novo quando as turbinas forem acertadas.
É isso aí. De grão em grão vamos passar pela crise e chegar lá.