Notícias do Congresso ISSCT
Na primeira semana do mês de setembro passado encerrou-se na cidade de Tucumán, na Argentina, o 30º Congresso Internacional da ISSCT, International Society of Sugar Cane Technologists.
Este evento trienal ocorreu em uma época que infelizmente comprometeu em parte o seu brilho, em função da grave crise econômica que assola a Argentina e em função do longo período de baixos preços do açúcar no mercado internacional.
Em compensação, a baixa cotação do açúcar tende a incentivar a produção de etanol. Tanto que a Sessão Plenária de abertura do Congresso ficou por conta do Brasil com o Dr. Plínio Nastari, que apresentou as potencialidades do etanol como biocombustível e os detalhes do Programa RENOVABIO que está sendo implantado por aqui.
Já na Argentina o governo já tem um novo plano para aumentar gradativamente a mistura de etanol na gasolina e assim incentivar o aumento da produção de etanol. Aumento de produção de etanol significa mais vinhaça para manejar, e assim as empresas da Índia estiveram presentes em peso no Congresso para propor a solução mais adotada lá por meio de incineração da vinhaça concentrada. Tratamos de obter o máximo de informações técnicas e práticas a respeito desta técnica para podermos comparar esta solução com a biodigestão da vinhaça, que é a técnica que está sendo mais preconizada no Brasil.
Vamos então procurar listar a seguir as apresentações que a nosso ver são realmente novidades para o setor industrial, o qual esteve dividido como de hábito em Engenharia, Processo e Subprodutos.
No âmbito da Comissão de Engenharia as palestras começaram com o já mencionado sistema de incineração de vinhaça que está muito difundido na Índia. Foram feitas apresentações indicando que já existem por lá muitas caldeiras incinerando vinhaça com 60% de brix utilizando bagaço como combustível suporte na proporção de 20% em peso, sendo que estão no momento desenvolvendo técnicas para reduzir esta última percentagem. O vapor produzido costuma ser a 45 bar(a) e 450 oC e informam que por razões técnicas não podem subir a temperatura. Uma complicação é a necessidade de parar as caldeiras a cada 120 dias para uma limpeza com ar comprimido que dura de 5 a 7 dias. Mas em compensação recuperam no mínimo 95% do potássio na forma de cinzas e não há resíduo líquido, desde que o condensado da vinhaça seja tratado para reutilização do mesmo. A maior caldeira já instalada tem uma capacidade de 75 t/h. Precisamos fazer as contas para comparar os prós e contras deste processo com a biometanização da vinhaça aqui no Brasil.
Com relação a moendas foram apresentados dois trabalhos interessantes (Austrália e Colômbia) referentes a estratégias para controle operacional de moendas utilizando medição de torque e rotação dos rolos e variação da seção do Chute Donnelly no primeiro terno, concluindo que a medição do torque vai melhorar a performance e certamente o grau de proteção para evitar danos nos equipamentos.
Foi apresentado um novo modelo de acoplamento para moendas, baseado no princípio do rolamento esférico, que esteve em operação durante duas safras em cinco ternos de uma usina na Indonésia. Foram obtidos os resultados esperados, porém para uma moenda de bitola 84” estão especificados um toque de 1200 kNm e motores de 700 kW, que para as condições do Brasil são valores muito baixos.
Ainda sobre moendas houve duas apresentações sobre camisas perfuradas com suas vantagens, uma tecnologia que veio para ficar e que deverá ficar cada vez mais barata. Um trabalho da Índia mostrando que moendas com baixa rotação apresentaram melhor extração, o que não é novidade, mas simplesmente uma questão econômico-financeira. Um trabalho da Índia mostrando que com a instalação de um inversor de frequência no desfibrador foi possível demonstrar que a potência maior consumida no preparo com IP melhor (obtido com maior rotação do rotor) foi mais do que compensada com redução de potência nos ternos da moenda. E outro trabalho da Índia mostrando resultados com a instalação de “calhas pressurizadas” na saída dos ternos para reduzir umidade do bagaço, mas cujos resultados não nos pareceram muito animadores.
Não houve nenhuma apresentação sobre tecnologia nova para difusores de cana.
Com respeito a eficiência energética houve apresentações para melhorar eficiência de queima em caldeiras antigas com uso de CFD e para reduzir consumo de vapor de processo com técnicas que já são conhecidas no Brasil, o que na prática se torna também um problema econômico-financeiro. Ou seja, o investimento necessário para obter consumo de vapor de processo abaixo de 30% sobre a cana retorna para o investidor em quanto tempo? Há menções de aplicações destas técnicas no Brasil que sabemos que já foram descontinuadas nas nossas usinas, como os evaporadores de filme descendente com placas por exemplo.
No âmbito da Comissão de Processo houve três palestras sobre cozimento contínuo apresentadas por fabricantes, sendo duas delas de empresas indianas lançando tachos contínuos verticais baseados no projeto VKT da BMA.
Foram apresentadas também três palestras sobre a utilização de NIR para as análises de todo o processo industrial, inclusive o pagamento da cana, sendo uma tendência no curto e médio prazo para as usinas que realmente querem ter informação confiável para controlar o processo com menos pessoal.
Um trabalho acadêmico muito interessante da Austrália com os resultados de testes de laboratório determinando o coeficiente de troca térmica de tubos usados em evaporadores Roberts, com um total de 9 combinações diferentes (3 diâmetros x 3 comprimentos).
Ainda sobre evaporação, talvez o melhor trabalho do Congresso do ponto de vista prático, aquele apresentado pela equipe da Usina Ledesma da Argentina descrevendo 20 anos de experiência com trocadores a placas para aquecimento e evaporação de caldo, demonstrando que efetivamente passaram a ter o real controle das operações depois de decidir pela instalação sistemas de CIP sofisticados similares àqueles instalados na indústria de laticínios.
Para finalizar outro trabalho detalhado mostrando a vantagem de condensadores barométricos sobre os do tipo multijato, sendo que neste caso o dinheiro voltou sim na forma de energia elétrica excedente.
No âmbito da Comissão de Subprodutos as apresentações referentes às alternativas para recolher a palha no campo e para a sua utilização na geração adicional de energia elétrica estiveram mais ou menos monopolizadas pelos técnicos do CTBE do Brasil (Projeto Sucre).
Alguns trabalhos apresentam propostas para gaseificação de bagaço e de palha, mas são textos acadêmicos que não apresentam tecnologias consolidadas do ponto de vista técnico e comercial.
Apareceram os relatos habituais visando a produção de inúmeros subprodutos do bagaço tais como biobutanol ou ácido fumárico, mas cuja viabilidade depende fundamentalmente do mercado e por consequência de economia de escala.
Os técnicos argentinos apresentaram trabalhos propondo a utilização de sorgo sacarino para aumentar a disponibilidade de biomassa combustível. Esta possibilidade já foi tentada no Brasil, mas os resultados do setor agronômico não se mostraram atrativos.
Em resumo, não houve uma apresentação nesta área digna de grande destaque do ponto de vista técnico.
Do ponto de vista econômico o Brasil apresentou um novo subproduto: o nosso CBio do RENOVABIO.
Agora é esperar as eventuais novidades do próximo Congresso em 2022 em Hyderabad, Índia.