Evaporação X Terceira Massa: Onde Investir?
Temos estudado ultimamente em diversas usinas as possibilidades para se aumentar a produção de açúcar para uma mesma capacidade de moagem.
Algumas vezes é possível obter um acréscimo razoável de produção pelo estudo detalhado dos “gargalos” na linha de produção e pela introdução de algum equipamento específico. Uma magmeira, um circulador mecânico, um tacho para granagem, uma modernização do secador – resfriador de açúcar, etc. Várias são as possibilidades.
Outras vezes os equipamentos estão no limite da sua capacidade e eficiência. Nestes casos, para se aumentar a produção de açúcar, há basicamente dois caminhos. Ou aumentamos a quantidade de sacarose enviada com o xarope, mantendo o mesmo nível de recuperação no cozimento, ou mantemos a quantidade de sacarose enviada com o xarope e aumentamos o nível de recuperação no cozimento.
Na prática significa investir em tratamento de caldo (basicamente aquecimento, decantação e evaporação) para se aumentar a produção de xarope, ou investir na implantação da terceira massa no cozimento.
Trata-se de problema cuja solução depende muito da relação de produção açúcar / álcool e dos equipamentos disponíveis na usina no setor de tratamento de caldo e no setor de cozimento. Não podemos por outro lado esquecer do balanço de vapor, o qual pode influir de forma decisiva dependendo da capacidade de caldeiras e da fibra média da cana (produção de bagaço).
Quando a usina não possui destilaria, evidentemente a solução é a terceira massa e a adoção de sistemas de cristalização (resfriamento de massa) adequados, visando obter o mel final com a menor pureza possível. É o caso, por exemplo, das usinas São Francisco e Cruz Alta no Estado de São Paulo.
Na grande maioria dos casos existe produção de álcool, e desta maneira é preciso estudar o problema caso a caso em função da produção relativa de álcool.
Vamos considerar, por exemplo, uma usina com moagem de 10.000 tcd processando uma cana média com 13,6% de pol e 0,8% de AR e com eficiências típicas: extração 96%, fermentação 90%, destilação 99,5%, perdas indeterminadas 3%, etc.
Admitimos em princípio que todo o caldo filtrado será enviado à destilaria, pois esta prática propicia uma melhor qualidade do açúcar ao mesmo tempo que normalmente evita a necessidade de adição de água para diluição do mel final para controle do ART do mosto.
O caldo primário desta usina contém mais ou menos 79% da sacarose extraída da cana (admitindo-se o caldo primário com brix de 18% e pureza de 87%) e contém mais ou menos 57% da água que deixa a moenda. Com uma recuperação no cozimento de 75% (típica para sistema de duas massas, embora possa ser maior), vamos produzir cerca de 1,32 sacos/t cana, ou seja 13.200 s/d. A quantidade de água retirada na evaporação será mais ou menos de 165 t/h.
Verificamos assim que a produção de 1,32 sacos/t cana mostra-se ideal para este caso, já que temos uma menor necessidade de evaporação e podemos produzir açúcar de excelente qualidade pela utilização apenas do caldo primário e pelo desvio do caldo filtrado para a destilaria.
Vamos agora admitir a necessidade de um acréscimo na produção de açúcar de 15%, passando para 1,52 sacos/t cana (15.200 s/d).
Uma primeira possibilidade é aumentar a produção de xarope, desviando parte do caldo secundário para a produção de açúcar, e mantendo o sistema de duas massas. A quantidade de água retirada na evaporação será mais ou menos de 241 t/h. Portanto, para um acréscimo de produção de açúcar de 15% foi preciso aumentar a água evaporada em cerca de 46%.
Uma segunda possibilidade é manter a produção de xarope e aumentar a recuperação no cozimento, passando para um mínimo de 86,5%. Neste caso não há investimentos em tratamento de caldo, mas sim em cozedores, cristalizadores e centrífugas contínuas.
Admitimos agora a necessidade de um acréscimo na produção de 25%, passando para 1,67 sacos/t cana (16.700 s/d).
A simples introdução da terceira massa não vai resolver o problema, e neste caso o investimento no tratamento de caldo, principalmente evaporação, é inevitável. E investir em evaporação e terceira massa ao mesmo tempo normalmente não é econômico.
Quando desviamos 100% do caldo para a produção de açúcar, embora mantendo o desvio de caldo filtrado para a destilaria, com sistema de duas massas (75% de recuperação) podemos atingir uma produção de 1,67 sacos/t cana, mas a água evaporada passa para 300 t/h, quase o dobro da condição inicial.
Para se ir além de 1,67 sacos/t cana, existem agora duas possibilidades: usar o filtrado na produção de açúcar ou então adotar a terceira massa.
Utilizando o filtrado podemos chegar a cerca de 1,81 sacos/t cana, ou seja um acréscimo de cerca de 8,4%. Mas a quantidade de água evaporada passa para 350 t/h.
Utilizando a terceira massa podemos chegar a cerca de 1,93 sacos/t cana, o que neste caso é a alternativa mais adequada.
Finalmente, com terceira massa e filtrado para açúcar podemos chegar a cerca de 2,1 sacos/t cana. Evidentemente que estes valores de sacos/t cana são altamente dependentes da qualidade da cana e da eficiência da indústria. Admitimos para duas massas uma recuperação de 75% que pode chegar até 78% por exemplo, a para três massa 86,5% que pode chegar até 88,5% por exemplo.
Podemos assim tirar algumas conclusões básicas:
- na faixa de 1,3 sacos/t cana o sistema de duas massas com caldo primário é imbatível;
- na faixa de 1,5 sacos/t cana o sistema de três massas com caldo primário é uma possibilidade que merece ser analisada caso a caso em função das condições específicas da usina;
- na faixa de 1,7 sacos/t cana a maior necessidade de evaporação é indispensável, e assim a terceira massa perde algumas vantagens;
- na faixa acima de 1,8 sacos/t cana a terceira massa é uma solução natural;
- o caldo filtrado impõe uma carga considerável na evaporação e contribui para piorar a qualidade do açúcar, e assim a sua utilização deve ser cuidadosamente avaliada;
- a qualidade do açúcar é um fator importante que deve ser levado em conta em todos os casos, já que é possível por exemplo adotar duas massas e recuperação baixa no cozimento visando sempre açúcar de excelente qualidade durante toda a safra;
- o balanço de vapor é outro fator que deve sempre ser levado em conta na tomada de decisão.
De qualquer maneira, embora procurássemos neste espaço fazer uma espécie de classificação por nível de produção de açúcar, cada caso deve ser cuidadosamente avaliado respeitando-se as condições específicas de cada usina.
Pretendemos na próxima oportunidade discutir os níveis de consumo de vapor de escape para cada uma das alternativas discutidas.