Etanol 2016!
Nossa programação original previa que este texto deveria ser entregue à Revista STAB em 05 de Outubro. Sentei para escrevê-lo no sábado 03 de Outubro tendo já em mente um tema técnico, como de costume. Na minha frente estavam os jornais do dia. Manchete da Folha de São Paulo: “Olimpíada de 2016 será no Rio”. Manchete do Estado de São Paulo: “Olimpíada de 2016 é do Rio”. Ambas com letras garrafais. Para um brasileiro que gosta do seu país é impossível não se emocionar. Resolvi mudar de tema, o assunto técnico ficou para a próxima edição. Vou procurar falar um pouco sobre o nosso país e o nosso setor.
É inegável que os Jogos Olímpicos, ainda mais com a Copa do Mundo em 2014, vão proporcionar ao Brasil um destaque inusitado em todo o mundo. E o Brasil é o país do etanol, o país da energia renovável. Por tabela o nosso setor será beneficiado por esta exposição intensa na mídia internacional. É nossa obrigação procurar aproveitar esta oportunidade.
Deve ser excitante estar hoje na faixa etária dos 20 aos 40 anos e ser brasileiro ou viver no Brasil. Há todo um país para ser planejado e construído, assim como vai ocorrer com o projeto das Olimpíadas. Os empresários e os técnicos do nosso setor têm inúmeros desafios pela frente, e desafio é o que mais nos motiva.
Tenho ouvido falar que a descoberta das reservas no pré-sal poderia inviabilizar o uso do etanol. Não acredito. A busca por fontes de energia renovável continuará a ser a regra em todo o mundo, e não existe nenhuma lógica em queimar as novas reservas vendendo-as a preços baixos, o que poderia inviabilizar o uso do etanol, pois por maiores que elas sejam, tais reservas são finitas. Portanto, pré-sal competindo com etanol é a meu ver um falso dilema. Infelizmente o nosso governo tem feito demagogia barata, dando a entender que tais reservas serão garantia da nossa prosperidade. Se petróleo tivesse alguma influência na prosperidade dos paises, o Iran seria um país rico e o Japão seria um país pobre. O que vai nos tornar mais prósperos será a nossa capacidade de formular novas soluções para o que o mundo quer: aumentar a produção de energia renovável.
Tenho ouvido falar que os carros movidos a etanol são mais poluentes do que os movidos a gasolina. Trata-se de uma análise parcial e tendenciosa. Em todo o mundo o que se busca são os assim chamados “combustíveis de baixo carbono”, os quais reduzem as emissões dos gases que provocam o efeito estufa. Mas o índice que saiu na mídia, indicando os carros a gasolina como menos poluidores, surpreendentemente ignorou as emissões de carbono. As classificações internacionais geralmente combinam três elementos fundamentais: poluição no escapamento, consumo e emissões de gases de efeito estufa. A combinação destes elementos sem dúvida vai indicar as vantagens dos combustíveis renováveis sobre os combustíveis fósseis. Aliás, foi o uso de etanol que propiciou a eliminação do chumbo como fonte de poluição na cidade de São Paulo.
Tenho ouvido falar que o futuro será dos carros elétricos ou movidos por hidrogênio. Os autores escrevem tais artigos na mídia como se eletricidade e hidrogênio pudessem ser encontrados na natureza a baixo custo. Para se produzir eletricidade e hidrogênio é necessário dispor de muita energia. A energia não renovável está armazenada na forma do petróleo. A energia renovável virá do sol, pelo uso de hidroelétricas, de biomassa, de energia eólica, de células eletro-voltaicas, entre outras. Carros elétricos ou a hidrogênio são importantes do ponto de vista do controle da poluição dos grandes centros urbanos, mas se pensarmos em termos do planeta terra, eles somente serão uma solução definitiva se a energia primária para a produção de eletricidade e de hidrogênio provier de fontes renováveis.
Tenho ouvido falar que o etanol de segunda geração, proveniente de fontes celulósicas, irá desbancar o etanol de cana. Não acredito. Quando esta nova tecnologia estiver comercialmente disponível, seja ela brasileira ou importada, um fato é inegável: o bagaço de cana continuará sendo a fonte de celulose mais barata, mais concentrada (do ponto de vista de logística para suprir a planta industrial), mais tecnicamente adequada (do ponto de vista de homogeneidade e de previsibilidade das suas características) e mais auto-suficiente em energia (que virá do próprio bagaço e eventualmente da palha). Portanto, se e quando o etanol de celulose se tornar realidade, o Brasil continuará sendo um país extremamente competitivo.
Tenho ouvido falar que o zoneamento agrícola para o plantio da cana de açúcar tornará as plantações anti-econômicas. Não acredito. A limitação da área autorizada para o plantio de cana gerou reclamações de alguns empresários, mas com certeza esta medida traz mais vantagens do que desvantagens. A ocupação com cana de pastagens degradadas e de áreas de pecuária com produção muito baixa deve sem dúvida ser priorizada. Se o Brasil não cuidar da sua imagem com relação à preservação do meio ambiente, haverá margem de manobra para atitudes protecionistas dos paises que não conseguem competir conosco na produção de etanol. Além disso, a seleção de novas variedades de cana com o auxílio da engenharia genética poderá proporcionar, no futuro breve, produções mais elevadas na mesma área plantada. E por falar em preservação ambiental, não podemos nos esquecer da vinhaça. Novas tecnologias, já em desenvolvimento, virão para garantir menores volumes de vinhaça e menor captação de água para uso na indústria. É nossa obrigação, como técnicos, procurar projetar plantas sustentáveis do ponto de vista ambiental.
Tenho ouvido falar que o açúcar seria o principal responsável pela enorme parcela de obesos na sociedade norte americana. Difícil de acreditar. Todos sabem que açúcar não faz mal, o que faz mal é excesso de açúcar. Aliás, como o excesso de qualquer alimento. Todos sabem que não é lógico alguém, a menos que seja diabético, sair de um rodízio na churrascaria e depois da sobremesa pedir cafezinho com adoçante. A mesma reportagem que responsabiliza o açúcar pelos obesos americanos, traz uma tabela indicando que Brasil, Índia, China e União Européia são maiores consumidores de açúcar do que os Estados Unidos. Quanta incoerência! Os autores, por má fé ou pura ignorância, não mencionam que lá grande parte dos refrigerantes usa em sua formulação xarope de frutose de milho. E esquecem o alto teor de gordura na dieta norte americana. O açúcar sempre foi e continuará sendo uma fonte calórica barata para povos com baixa renda. E este pessoal não fica obeso pela simples razão de não ter dinheiro para consumir muito. Quem tem dinheiro precisa ter também educação alimentar, é simples assim.
Tenho a certeza de que no dia de hoje 03 de Outubro todos os que gostam do Brasil devem estar pensando que devemos procurar fazer a melhor das Olimpíadas. Nem todos poderão estar trabalhando para o Projeto Rio 2016, mas quem trabalha em um setor como o nosso, que tem a cara do Brasil, deve estar consciente de que tem também um grande desafio pela frente.
Consolidar a imagem de que o Brasil em 2016 será o campeão da energia renovável. É nisto que eu acredito.
É verdade que sabemos que nem a igreja, nem a bíblia, nem o partido, nem o líder genial, nem as massas, nem ninguém é capaz de sempre estar certo. Nada está acima de ser criticado. Mas todos precisamos sempre acreditar. Quem acredita acaba realizando.
Este texto entregue para a Revista STAB é o de número 84. Ao ritmo de seis textos por ano, e desde que a paciência dos leitores permita, nas vésperas das Olimpíadas de 2016 vamos estar lá pelo número 125. Poderemos então fazer um avaliação de como estará o projeto olímpico e de como estará a imagem do Brasil como a potência da energia renovável.
Depende de nós e vamos conseguir. Eu acredito!