Lavador X Precipitador
No idioma alemão existe um termo interessante que é “Zeitgeist”, o qual em português pode ser traduzido como “O espírito de uma época”. No inicio do século passado, o voto não ser facultado às mulheres era normal. Em 1977, quando visitei a África do Sul pela primeira vez, brancos e negros usarem ônibus diferentes era normal. Nos dois casos, algo inadmissível nos dias de hoje. O espírito da época está sempre mudando.
Podemos afirmar sem medo de errar que o “Zeitgeist” de hoje e dos próximos anos será a conscientização de que devemos economizar água e energia o mais que pudermos.
Estivemos recentemente trabalhando na especificação técnica de caldeiras de grande porte queimando simultaneamente vários tipos diferentes de biomassa. E surge assim a importante questão, vamos de lavador de gases (LG) ou vamos de precipitador eletrostático (PE)?
Como de hábito ambas as soluções tecnológicas têm vantagens e desvantagens quando comparadas entre si, sendo interessante discutir os parâmetros de comparação.
Controle das emissões atmosféricas: Salvo exigências específicas, as duas soluções podem atender às exigências usuais dos órgãos ambientais. O PE tem geralmente um projeto modular, de maneira que eventuais apertos nas exigências ambientais podem ser previstos no projeto original considerando-se a eventual instalação de módulos adicionais.
Retirada das cinzas: Com LG as cinzas são retiradas via úmida e com PE as cinzas são retiradas via seca.
Consumo de água: O LG utiliza de 1,0 a 1,5 t água / t vapor (água em recirculação), dependendo da sua tecnologia e do tipo de fornalha da caldeira. Este valor já inclui a quantidade necessária de água para o transporte úmido de cinzas coletadas em pontos diversos da caldeira. O consumo de água de reposição está na faixa de 0,12 a 0,18 t água / t vapor, já que uma parte importante deste valor é a evaporação de água em função da temperatura do gás de combustão. O PE não utiliza água, desde que todos os pontos de retirada de cinzas estejam equipados com equipamentos adequados para transportar cinza seca e quente.
Consumo de energia elétrica: O LG em si não utiliza energia elétrica, mas a energia consumida na ETALG (Estação de Tratamento de Água do Lavador de Gases) e principalmente nas bombas de água servida e de água tratada corresponde a cerca de 1,20 kW.h/t de vapor (300 kW para uma caldeira de 250 t/h). O PE utiliza menos da metade desta energia, algo como 0,55 kW.h/t de vapor. Porém estes valores devem ser cuidadosamente verificados em cada projeto específico. No caso do LG a distância e o desnível entre a caldeira e a ETALG podem aumentar a potência das bombas. No caso do PE há que considerar a potência instalada nos transportadores de cinza seca e o eventual aumento da potência dos exaustores da caldeira em função de uma alta perda de carga no equipamento.
Consumo de insumos: A ETALG pode necessitar de produtos químicos para melhorar a floculação e por consequência melhorar a decantação. O PE não necessita de insumos na sua operação.
Necessidade de mão de obra: Em principio não deveria haver diferenças desde que exista um bom sistema de automação e controle. A ETALG poderia exigir um operador a mais caso estivesse instalada muito longe da caldeira.
Necessidade de manutenção: As bombas, peneiras e filtros da ETALG no caso do LG e os transportadores de cinza seca no caso do PE são os equipamentos que devem ser muito bem especificados e mantidos para diminuir as ocorrências imprevistas por problemas de manutenção. Lembrando que normalmente há bombas de reserva instaladas, o que não é o caso dos outros equipamentos mencionados. Os custos anuais de manutenção provavelmente são mais ou menos equivalentes para os dois sistemas.
Investimento inicial: O LG é mais barato do que o PE, mas a ETALG é mais cara do que os transportadores de cinza seca. Será sempre necessário estimar o total do investimento para os dois sistemas. O LG e seus acessórios são 100% fabricado no Brasil. O PE tem componentes importados e assim a taxa de câmbio na época da negociação pode ser relevante.
Custo operacional: Sem sombra de dúvidas é mais barato operar o PE. Este sistema não consome água e os insumos relacionados com o seu tratamento, usa menos energia elétrica e entrega as cinzas secas. O transporte das cinzas secas para a lavoura vai requerer uma frota de caminhões com cerca de um terço da capacidade da frota que transporta cinza úmida da ETALG.
Limpeza da planta: Caminhões transportando cinza úmida da ETALG costumam deixar um rastro indesejado de sujeira pelos caminhos que transitam. Porém, cinza seca pode também provocar nuvens indesejáveis de pó em dias de vento mais intenso. Desta maneira os transportadores de cinza seca devem ser fechados e devem ser previstos sistemas de aspersão em pontos estratégicos de carregamento dos caminhões de cinza seca.
Resumo da ópera: Recomendamos estudar as duas alternativas de processo quando da instalação de caldeiras novas de grande porte. Pode ser que o custo operacional mais baixo do PE justifique investimentos mais elevados, principalmente em épocas de água escassa e de energia elétrica e combustível automotivo mais caros.